Reflexões sobre Rodas I


        Esta semana estava pegando ônibus pra ir trabalhar, e dois dias seguidos tive surpresas interessantes com a tripulação do "Alferes Nóia"... na quarta feira pego o ônibus com o candidato "Louco" ou mais conhecido por "Ninguém", anuncia o interlocutor do personagem: um homem com seus 30 /40 anos (ou talvez só aparente isso por conta do crack)  que começa a parodiar a canção célebre do candidato Profº Galdino (segundo ele mesmo)... "Ninguém" vai mudar, "Ninguém" vai ajudar, "Ninguém" vai fazer... e se estendeu durante todo percurso em sua campanha para algum cargo que eu desconheço, na sua elocução ele fez sátiras interessantes, que agora não me recordo, com relação a educação, saúde e tal, foi uma experiência que me fez refletir sobre de onde vinha aquela "manha" e esperteza pra articular tão bem seu pensamento.
Na sexta feira, outro indivíduo (que não vi direito porque entrou pela porta de trás do ônibus) começou um discurso muito bem articulado sobre barras de chocolate e Guiness Books: num só dia havia roubado 327 barras de chocolate!
- 327... [Ele frisava] Soube de cara que robou 80, 100... mas 327?! Põem lá no Guiness, essa tem que ir pro Guiness: Bandido rouba 327 barras num único assalto... vendi tudo a um real, ganhei 327 reais num dia...
E seguiu seu discurso sobre seu record tentando convencer seu colega de que havia atingido um grande feito.
        E hoje, sábado, me deparo com o vídeo do Badaróss [Vídeo TV Folha "Badarós: Os traços e a história do 'Basquiat da cracolândia'] em que o protagonista disfere seu discurso contra a burguesia... 
     A visão que estas pessoas, que estão a margem, tem da sociedade é um tanto interessante, pensar que sua criticidade, tão comprometida pela falta de acesso à informação e a manipulação a que estão suscetíveis, ainda assim se articula num discurso empirista, que se analisado sob este foco, tentando pensar como pensam, mostram seus fundamentos de revolta, que justificam sua drogadição e banditismo e mostram apenas que o que se vê, seja com as crianças dançando funk ou com um "crackeiro" artista nada mais denotam que a realidade a que estão condicionados por sua condição sócio-político-econômica e cultural!
Há sim inteligência, potencial e reflexão nas classes marginalizadas, há articulação de ideias e oratória, há boas intenções, mas as bases que lhes são dadas e sob as quais constroem suas vidas são corrompidas, tanto por seus iguais, quanto pela "burguesia" que Badáross cita (e nem compreende na verdade o que é, sua verdade histórica) lhes impõem para que permaneçam neste seu "estado de vida".
    Não se pode mais condenar os marginalizações pela sua realidade e cultura puramente sob argumentações puristas e superficiais (e minha defesa não é pelo "politicamente correto", mas sim pensando na criticidade que todos, inclusive nós, os abastados, devemos nos impor), porque por mais que estes indivíduos citados teçam suas argumentações sob reflexões massificadas, eles admitem suas misérias e falhas enquanto homens, sua entrega às drogas, a violência, mas nós do outro lado, os socialmente "favorecidos" (não importa qual a intensidade da benesse) nos preocupamos apenas em condená-los pela sua postura, pelas suas práticas, sem analisarmos criticamente nossas escolhas e realidades, o que só fomenta a marginalização de habitantes de regiões periféricas e fomenta sua cultura de drogadição e violência.

Nenhum comentário:

Postar um comentário