Vermelho, de John Logan trás o pintor Mark Rothko para cena

            Rothko não se julgava um pintor abstrato. 
“Minhas cores são mais do que cores”, esclarecia. 
“São atrizes.”
 Intérpretes dedicadas e habilidosas, que buscam instigar o público e exprimir “a tragédia humana, as emoções elementares”. 
             Ele tinha, segundo vários depoimentos, uma relação obsessiva com as próprias criações, frutos de muito cálculo. Sofria ao vê-las “sair pelo mundo” e, não raro, chorava diante da separação. Também reivindicava de museus e galerias condições perfeitas para exibi-las. Tentava controlar os mínimos detalhes: a intensidade da luz, o posicionamento das obras na parede, a distância que o observador deveria manter de cada quadro. Se não o atendessem, armava um fuzuê ou cancelava a exposição. Quando recebia elogios do tipo “você faz pinturas lindas”, se exasperava. 
            Não queria que o confundissem com “um decorador de interiores”. 
          À semelhança de outros papas da abstração, torcia o nariz para os antecessores – ícones das vanguardas como Picasso e Salvador Dalí. 
“Envelheceram mal. Acomodaram-se”, bradava.
         Tampouco livrava a cara da geração que o sucederia (e ofuscaria), a de Andy Warhol, Robert Rauschenberg, Jasper Johns e Roy Lichtenstein, astros da pop art. Taxava todos de superficiais, lacaios da cultura de massa, tão descartáveis “quanto um lenço Kleenex”. 
Não satisfeito em matar os pais, desejava trucidar os próprios descendentes.

         No verão de 1958, aceitou a encomenda que o espetáculo de John Logan menciona. A destilaria canadense Seagram planejava revestir três paredes do restaurante Four Seasons com murais do artista. 
       O luxuoso estabelecimento de Manhattan, que continua funcionando, abriu em 1959 e se localiza no edifício-sede da empresa. Projetado por uma dupla de exímios arquitetos, o alemão Mies van der Rohe e o norte-americano Philip Johnson, costuma reunir a nata financeira da cidade. O pintor ganharia US$ 35 mil pela empreitada – cifra que, atualmente, se aproxima dos US$ 2 milhões. 
       Durante meses de trabalho exaustivo, confeccionou 27 quadros. Do conjunto, pretendia extrair os nove do restaurante. 
“Vou tirar o apetite dos ricos calhordas que frequentam o lugar”, 
                                                                           trombeteava enquanto preparava a série. 
        Não se tratava de mera bravata. Ele realmente acreditava que os comensais esqueceriam o menu quando avistassem as pinturas e vivenciariam algo como uma epifania – o início de uma transformação moral, impulsionada pelos sentimentos que as telas despertariam.
       Ocorre que, tão logo o Four Seasons inaugurou, Rothko o visitou e... 
“Quem aprecia aquela comida, quem paga aquele preço nunca colocará os olhos num quadro meu!”,
          rosnou para um amigo, ao telefone. 
“Era uma descrição ou uma prescrição? Uma triste constatação ou uma ameaça?”, 
           pergunta-se Simon Schama. 
O pintor jamais respondeu. Apenas abriu mão da ­incumbência e devolveu o adiantamento de US$ 7 mil. A partir de então, se deixou tragar por ondas gigantescas e periódicas de melancolia. Acabou cortando os pulsos em 25 de fevereiro de 1970. Suicidou-se horas antes de os nove murais do Four Seasons chegarem à Tate Gallery, de Londres (hoje Tate Britain), onde ainda ocupam uma sala.
 
Fonte: Revista Bravo


 
Mark Rothko, The Omen of the Eagle,1942, National Gallery of Art, Gift of The Mark Rothko Foundation, Inc., 1986.43.107




























Mark Rothko, Sacrifice of Iphigenia,1942, Collection of Christopher Rothko 


















Mark Rothko, No. 17 [or] No. 15, 1949, National Gallery of Art, Gift of The Mark Rothko Foundation, Inc., 1986.43.142 




















Rothko in his West 53rd Street studio, painting what may be a version of Untitled,1952-1953 (Guggenheim Museum, Bilbao), photograph by Henry Elkan, c. 1953 























 

Nenhum comentário:

Postar um comentário